quarta-feira, julho 12

Piano Bar. Três mesas adjacentes. Doze pessoas. E alguns abalos sísmicos.
- Um movimento não pode ser planejado, gente. Ele tem de acontecer, naturalmente.
- Quem disse?
- É a lógica.
- Eu acho que ele pode ser induzido, sim.
- Eu também.
- Eu também.
- Nem. Doze pessoas não vão conseguir mudar a cultura.
- E quem falou em “mudar a cultura”. Vamos contribuir para ela.
- Dá na mesma.
- Quem disse?
- Isso é muita responsabilidade, moçada. Olha pra nós. Nós não somos um Bandeira ou um Andrade.
- Nada a ver...
- E daí? Somos Silva, Albuquerque, Mendes. E isso é o que importa.
- Vão rir da nossa cara. Nós não temos preparo. E nem bagagem.
- Ficou sabendo que o Syd Barrett morreu, mano? Mas que droga!
- Pô, Marcão, presta atenção na conversa. Isso é sério.
- Foi mal.
- Eu acho que precisamos convocar pessoas com nossos mesmos ideais.
- Isso mesmo. Propomos uma reformulação da literatura, da pintura, do cinema, enfim...
- De todas as artes.
- Isso. De todas.
- Até das novelas?
- Novela não é arte.
- Quem disse?
- Mas precisamos pôr tudo no papel.
- Deixa que eu escrevo.
- Nem... Eu escrevo.
- Todos escrevem. Cada um coloca suas idéias sobre o movimento. Depois fazemos um apanhado geral.
- Eu já tenho várias idéias.
- Eu também.
- Ainda não pensei em nada.
- Pô, coitado do Syd. Cego, doidão e recluso. Se não bastasse isso, agora, morto.
- E depois, o que vamos fazer? Como vamos convocar o povo?
- Espalhar cartazes na universidade...?
- Internet, moçada. Internet.
- Sem chance. Convidar quem a gente nem conhece? Precisamos olhar nos olhos das pessoas. Convocar desconhecidos estranhos anônimos está fora de cogitação.
- Isso não vai dar certo. Olha só pra nós. A gente vai virar piada.
- Outdoor.
- Outdoor? Tá louco? O negócio é propaganda boca-a-boca. Mais confiança. Maior controle.
- Falando em boca, porque vocês não calam a boca e deixam o Mestre falar. Afinal, a idéia veio dele. Diz aí, Messina, que que tu acha?
- “Novos horizontes / Se não for isso, o que será? / Quem constrói a ponte / Não conhece o lado de lá”
- Não tô falando que esse cara é porrada no último???
- Com o professor estaremos bem representados.
- E como!
- Quem aí falou em “bagagem”? O professor tem toda a bagagem de que precisamos.
- É isso aí.
- Acho que devemos tentar. Acho que vai dar certo.
- Eu também.
- Eu também.
- Não sei, não.
- Se não der certo, pelo menos, vamos crescer como pessoa. Vamos acabar amadurecendo, de um jeito ou de outro. Como disse o professor, de ponto de interrogação em ponto de interrogação, encontraremos todas as respostas de que precisamos.
- E de resposta em resposta, nós nos sentiremos cada dia mais completos.
- Pô, o Pink Floyd sem o Syd nunca mais foi o mesmo.
- Quem disse?

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