segunda-feira, julho 10

Se tudo o que chega ao fim tem um princípio, então, preciso dar início à minha vida antes que ela se acabe.
Penso nisso várias vezes enquanto dou minha aula, enleado com meus pontos de interrogação, inclusive o existente entre Rimbaud e Humberto Gessinger. Ainda não encontrei a resposta, mas estou chegando lá.
Agora, fito meus alunos. Tudo me parece repetitivo ali. Um filme em preto-e-branco, reprisado assiduamente durante as madrugadas. Eles, estáticos. Como eu. E parecem em dúvida. Como eu. Concluo que já passa da hora deles nascerem. Estão vinte, vinte e cinco, alguns até trinta anos atrasados. O registro de cada um diz que nasceram, mas isso é apenas mais um engano do sistema burocrático. Eu e eles – somos embriões. Conseguiremos nascer? Eis a causticante interrogação.
Chego, enfim, aos últimos cinco minutos de aula – os piores. Debruço-me sobre um livro de não sei quem. Não presto atenção no que leio, apenas no que penso. Espero os cinco minutos passar. Os alunos não ficam impacientes com meu silêncio – eles já me conhecem o bastante. Silêncio, eis teu súdito aos teus pés. Então, os cinco minutos se vão, procumbentes. E meus alunos começam a se levantar. Já passa da hora de todos nós nascermos! Eu sei que sim.
Levanto-me. Vou até o quadro-negro, e escrevo:

“SE TEM PESADELOS A NOITE, MAS ACHA QUE PODE SALVAR O MUNDO, PERMANEÇA EM SEU LUGAR”

Então, volto à minha cadeira e ao livro de não sei quem. Mantenho a cabeça baixa. Ouço ruídos. Cochichos. Uma ou outra risada. Alunos e mais alunos deixando a sala. Confusão em minha mente. Minha pele desprendendo-se, suavemente, do meu corpo. E assim, vou diminuindo. Cada vez menor. Menor... Vários minutos se passam. Não sei quantos. Talvez cinco. Talvez trinta. Talvez eu esteja voltando no tempo, como um McFly.
Não vejo nada. Minha visão periférica não alcança nada além de minha mesa e de minha pele desprendida. Acho que estou sozinho, em minha sala. Todos foram embora, provavelmente. Ficamos eu e meus restos. Vou juntar tudo e ver se construo um rato... Então, lentamente ergo a cabeça.
E, para minha surpresa, vejo dez alunos, estáticos, em seus lugares. Eles me encaram. Esperam. Querem nascer. Por isso, esperam. Não sorrio com nenhum canto de minha boca. Há demasiada seriedade no momento para isso. A vida de dez jovens e um professor lunático está em jogo. Não sorrio. Não mesmo.
Vou novamente ao quadro-negro e escrevo:

“PIANO BAR. QUARTA-FEIRA. 21h00”

Saio da sala.
Para todos os efeitos, a aula está acabada.

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